terça-feira, 28 de junho de 2011

POEMETO CARICATO

Esse é um poemeto que eu fiz, brincando,
pra comemorar o aniversário de 80 anos do meu pai,
há três anos atrás. Ultimamente, venho aprendendo com ele que os pais viram filhos,  mas ao reverso, porque começam a desaprender. E precisam da nossa mão para dar os últimos passos, balbuciar as últimas palavras e ver o mundo pela última vez.
Muito bem! Exclamou o conde, ao apalpar as nádegas da condessa!
Vamos lá! Sem choro, nem vela! (como sempre disse meu pai).

(A foto é da minha irmã, Marta)

O ABEDECEDÁRIO DO OCTOGENÁRIO

Indagaram ao octogenário
Na festa de aniversário:
A chegada aos oitenta
Exige vida sedenta?

E o velhinho, cambaio,
Olhando, assim, de soslaio
Riu sua risada sem dentes
E falou, sem entrementes…

Não queira ter, aos oitenta
A força que está nos quarenta.
Nem aparência de vinte,
Quanto está mais pra pedinte.




Pros oitenta, não tem segredo,
Basta envelhecer, sem medo.
Guardadas tais proporções,
Aí vão algumas lições:

Não se esqueça do prazer
Pra você não fenecer...
O mundo é cheio de vícios
Aproveite os benefícios!

Comece devagarzinho...
Só um trago na cachaça
Pra acompanhar o vovô.
Evolua de mansinho...
Até chegar à moafa
e não dizer nem alô.


Mas atenção ao limite!
Abandone o vício aos sessenta
Só assim você chega aos oitenta.

Não se esqueça de um bom pito
Pra aliviar a tensão.
Depois do café, almoço, enfim...
Sempre que o tiver a mão.

Mas atenção ao limite!
Abandone o vício aos setenta
Só assim você chega aos oitenta.

Um bacon e um torresmo
Também não podem faltar.
Só não os coma a esmo!
Apenas no almoço e jantar.

Mas atenção ao limite!
Abandone o vício aos oitenta.
Só assim você chega aos noventa.

E enquanto tiver visão,
Mente, boca e coração,
Namore todas as moças,
Não abra qualquer exceção.

E aí não respeite limites!
Pois quem não as come aos oitenta,
Com toda imaginação,
Não fecha os cem anos não.
[Marina Procópio]
















segunda-feira, 20 de junho de 2011

UM RETRATO DO VALE



Um dos maiores presentes que ganhei nessa estada no Vale foi conhecer essa cultura ímpar, que nestes meses vivi como lar. É, então, com muito carinho, que tento pintar minha gratidão neste retrato.


Esse mundo que o sinhô tá veno
não dá pra ver direito só de passagem
Tem de ficar uns meis com a gente
que é pra sentir as paragem

Se vai de passagem só enxerga a pobreza
A terra seca, o rio escasso e os muito arbusto
as mão e a cara rugada e queimada de sol
é o que fica na foto do viajante

Mas se fica pra sentir as paragem, meu sinhô
bebe a água do rio e cora nesse sol judiado
é que vê que esse mundo aqui do vale vale muito
vale mundo inteiro que não se vê

Nesse curso do Jequitinhonha, meu sinhô
tem de terra e tem de água
de cada um só um pouco
bem pouquinho mesmo, módi a gente dá valor

Largo mesmo é só o céu, os santo e a dor
Desses todo mundo prova um pouquinho
novo, véio, rico, pobre, pardo ou de cor
módi seguir vivendo em bênção nesse lugar

Ladeando o Jequitinhonha ou os magro riachinho,
um rosário de terrinhas de roça, de vila ou pequena cidade
Muitos são os homens da roça e poucos os moço de cidade
As muié e as criança, contudo, vão levano por todo lado

Como eu disse, meu sinhô, não se engane
aqui há do bem e também do mal, um pouco de cada um
misturado no coração de cada qual
Primeiro vou do pió, pra depois redimir com o mió

Nessas banda há gente ruim sim, meu sinhô, se há
Gente ruim de sangue, bode véio mesmo, que se perde de tanta maldade
que morre dizendo que se soubesse que ia sofrer tanto assim pra se ir
ia era muito mais maldar e matar

Há gente ruim de outro jeito também
que tira à força dos muitos pobre o pouco que a vida ainda dá
Bota medo, briga ou mata em ponta da faca ou bala de espingarda
pra módi tirar, daqui e dali, um bocadinho de terra, de água ou de ar

Essa gente, meu sinhô, é aquela que fácil se acovarda
Nasce ou vive de umas poucas posse e de dar o que falar
querendo se fazer rico do que essa vida nunca dá
que é segurança contra a miséria, a cruz, a morte, o que há

Enquanto essa gente continua a mandar e desmandar
não há verdadeira saída, meu sinhô, pros lado de cá
O que há é seguir vivendo a vida, cada qual no seu canto
rezano pra um dia com eles não ter de topá

Nessas terra há também uma outra maldade, meu sinhô
Não é da ganância ou da covardia perante as dificuldade da vida
É a da raiva e da ira por coisa boba que afete honra ou coração
que também mata em faca, cabo de enxada, arma feita ou podão

O que eu sinceramente não sei dizer, meu sinhô
é se esta é menos pior que as otra maldade, inté desconfio que seja
porque aquelas tem frieza, e essa é quente, de explosão
mas que mata mata, tanto ou inté mais, e também sem saber

Já vi muié morrer por usar batom ou cortar cabelo
por passear em casa dos pais ou por qualquer pouca traição
Já vi irmão matar irmão por porco inteiro ou pedaço de frango
e vizinho matar vizinho por conta de muita cachaça e pouca discussão

Mas um detalhe dessa maldade, meu sinhô, tenho de alembrá
O sinhô não esqueça que é gente simples, que não sabe conversá
que cresce capinando o mato, ouvindo e imitando som de bicho
e sem palavra a solução pra tudo passa a ser brigá ou matá

No mais, tem uma outra maldade, meu sinhô, que é da lei do lugar
Em terra bruta, de difícil vivência, pode mais quem tem mais força
Então os ômi tão em melhor posição, com mando e desmando
E os mais fraco obedeceno se tem juízo, véio, criança e muié

Mas chega de falar de maldade, né, meu sinhô
se não sinhô resolve ficá só de passagem
levano só o seco e os osso dessas paragem
sem salvar com a beleza pura desse lugar a sua viagem

Como eu lhe disse, meu sinhô, não se engane
aqui gente boa é maioria, que trabalha em honesto
módi sustentar a famia sem causar prejuízo a ninguém
levano no lombo bem em diante o fardo pesado que tem

É toda essa gente que o sinhô vê arano essas terra
moiano com a pouca água que sobrou
fazeno brotá o que ainda não há
e o que o desistir ainda não levou

Gente que banha todo dia essas terra de muito suor
Seguino vida dura, de levantar e se deitar com o sol
Forjano com todo sacrifício cada coisa de precisão
Do beber e do comer ao sonhar, imagine o senhor então

Desde a água que se panha a longa distância para tudo o que há
O plantio de tudo quanto se precisa pra uma mesa botá
Arroz, feijão, milho, mandioca, cana, horta e pomar
Inté galinha e gado, pra ovo, leite e carne e otras iguaria prepará

Inté pra vestir algodão, meu sinhô, deve de se trabalhar
Não esqueça que pra se fazer farinha, há muito que pilar
As louça toda de barro queimado, os móvel de madeira cortada
Tudo o sinhô viu, inté as boneca das menina, tirada de paia de milho

Tudo isso à custa de muito trabalho, meu sinhô
Tanto que ômi fica na terra e muié na casa dia inteiro, dia entra e dia sai
Só hoje é que criança é liberada do trabalho módi estudá
Ainda assim trabalho maior não há pra elas que levar adiante esse lugar

E completa não ficaria a bondade, meu sinhô
se eu não lhe falasse, pra além do trabalho e da honestidade
da caridade dos ômi e das muié desse povo
que pouco tem pra si e pros seus, mas que muito dá pros que passar

O sinhô mesmo deve conferir, nas casinha deste lugar
há sempre café com pão ou biscoito pras visita
almoço ou janta para o que chega faminto
cama pro doente ou pro que precisa de pousá

Casa aqui é abrigo, é lar
Cozinha é aconhego, alimento
Prosa é carinho, é mornura
E cordialidade é só um pouco do muito que se dá

Essas são as posses maiores dessa gente boa
que muito pouco tem e que tudo doa
operano o milagre de multiplicar com amor
o bem pouco em muito bem

Quando chega a festa de Nossa Senhora do Rosário, meu sinhô
é hora dessa gente agradecer a Deus e à Senhora tudo o que tem
Levantar as mão, entoar hino e verso de louvor, numa beleza de coro
que ecoa longe, por todo esse vale de reza, que se ouve lá do céu

E por falar em céu, meu sinhô, por aqui há uns anjo
 que dele se perdeu e não se acha em outro lugar
com uma bondade tão boa, tão pura
que neles só se vê a inocência, a luz e a cura

Esses anjo tão bem solto por aí
no meio dessas roça, dessa gente toda
mostrando o que é paz, caridade e perdão
servindo pra nóis de ponte com o Pai, com Eva e Adão

Soltos por aí tão também uns lôco, meu sinhô
de nascença, de crescença, de acidente ou de velhice
Uns meio são, meio lôco, outros, muito estranho, mais são que lôco
parecendo mais certo que os que se acham certo

Há também muitos mestre e artista por aí, meu sinhô
que sabem mostrar melhor que eu as belezas deste lugar
Com benzeção, trazem a paz, com palavra, sabiduria e conforto
com viola, a emoção, e do barro, tiram o retrato desse povo

E no meio de tudo isso, meu sinhô, tem o mais dessa gente
gente, pelo que eu sei, como eu e como o sinhô
que faz do preto e do branco um prato bem temperado
viveno sem mais graças ou desgraças, só que aqui viveno de trabalhá

Mas o trabalho não rendeno por aqui as riquezas do progresso, meu sinhô
só mesmo os frutos do próprio trabalhá
Bem material, muito não há, mas uns poucos, que se reparte bem ou mal
O que sobra de fato é a vida, que cada um mesmo é que tem que levá

Aqui, meu sinhô, não se engane
há um pouco de tudo que há por aí, só que diferente,
em pedra bruta, ou feito à mão e ornado em barro,
numa simplicidade de beleza que é só daqui

Nesse vale do Jequitinhonha, meu sinhô, riqueza não parece que há
Mas há sim, meu sinhô, e muita. Mas ela é como visão de beleza
De passagem, pressa ou afobação, querendo muito, a gente não vê não
É todo dia, escondida e aos pouquinho, que ela vem se mostrá


[Poly Jeha]

quinta-feira, 16 de junho de 2011

OUTROS PETs

Não me refiro ao controverso politereftalato de etileno, polímero que deu origem às garrafas pets que, fabricadas inicialmente na década de 70, movimentam hoje, só no Brasil, uma produção de cerca de 9 bilhões de unidades anuais, das quais 53% não são reaproveitadas.
Refiro-me aqui aos pets animaizinhos. Aquelas fofuras que enchem nossa vida de alegria sem esperar nada em troca e, mais especificamente ainda, àqueles que estão por aí abandonados e mal tratados.
A idéia para meu texto do mês veio após o passeio matinal com Dudu, um lhasa adotado há dois anos. O bichinho chegou pele e osso!
Encaminhado à nossa casa por uma clínica veterinária que recolhe, cuida e encontra uma família para eles, o sujeitinho de cara nos conquistou!
É claro que, apesar de muito dócil, era arredio e bastante sofrido!
Hoje é o dono do pedaço. Sabe muito bem nos dobrar com as travessuras mais inusitadas! Sua energia não se esgota nunca. Companheiro de todas as horas, está sempre atrás de um de nós com seu andarzinho bamboleante!
Adaptou-se a rotina da casa. Alegrou o dia-a-dia da casa!


Percebo, muito satisfeita, que, assim como cresce a conscientização das pessoas contra a destruição crescente do planeta, fortalece-se o movimento de adoção desses bichinhos abandonados.
Exemplo disso é a, hoje gordinha e feliz, vira-latas Meg. Adotada, para minha total surpresa por minha mãe que nunca suportou animais em casa.
Não sei se me engano mas parece-me que essa conscientização surgiu meio às avessas. Hoje é super cool adotar um animalzinho. Quanto mais indefinida a raça, mais estropiado o bichinho, mais descolada é a atitude!
Bom, a razão ou motivo pouco importam. Que todas as pessoas queiram ser descoladas e modernas e mesmo aquelas que não considerem a idéia de adotar um bichinho abandonado que, pelo menos, se tornem mais preocupadas com eles.
A quem interessar segue abaixo alguns candidatos à adoção e o endereço de uma associação que os acolhe e protege, cuidando deles até que sejam encontrados novos lares. Contribuições também são muito bem-vindas!


quarta-feira, 1 de junho de 2011

ECOLÓGICOS


O contemporâneo surpreende. E suas intermináveis campanhas publicitárias em favor da ecologia suscitam reflexão. Agora, em minha cidade, não há mais sacolas nos supermercados e as que existem são biodegradáveis, custando R$ 0,19 cada uma: lei municipal.

Ao que me pareceu até agora, a iniciativa legal causou mais resultados do que tantas campanhas de marketing e lançamentos de modernas bolsas ‘ecológicas’. Estamos usando menos plástico. E mesmo para aqueles que preferem pagar pela embalagem, o consumo diminuiu, ao economizar colocando mais produtos na mesma sacola.  

Entretanto, ainda precisamos pensar que o lixo antes nelas colocado terá que ir para algum lugar. Quem sabe sacolas de plástico, próprias para dejetos e que, curiosamente, não são biodegradáveis, mas são igualmente vendidas? Também os sacos de plástico para “sacolão” continuam sendo utilizados. E sem biodegradação!

Quantos mercados ainda serão descobertos, obrigando-nos a gastar o que não temos? Inclusive com suas indispensáveis publicidades? Tornando-nos cada vez mais caros? Mais consumidores?

Esse é outro pedaço da questão, que ainda não solucionamos.

Pois é. Ainda me recordo (e nem sou tão velha assim) de ir ao supermercado com um engradado vazio de reutilizáveis garrafas de vidro e de trocá-las pelos mesmos recipientes, cheios. Estávamos todos acostumados a essa lógica que, aos olhos de hoje, soaria absurda em função do “trabalho” que dá! Ainda que fosse um trabalho que não sujava o mundo...
Nunca compreendi a introdução de garrafas “pet” no planeta...

E sobre os desperdícios da nossa geração? Compramos belas caixinhas de plástico e jogamos as que embalam alimentos fora, quando elas resolveriam perfeitamente a nossa necessidade de recipientes! Há quanto tempo não vejo sacolas de papel ou alimentos embalados em jornais? E restinhos de sabonete juntinhos, formando um “sabonetão”, perfeito para uso? Copos de requeijão em casa? Já era! Cafona demais!

Mais bonitos, mais poluidores e mais superficiais. Esses somos nós, hoje.

Acredito em iniciativa e conscientização individual, não me entendam mal. Mas para várias questões (e o exemplo da sacola de supermercado em minha cidade demonstra isso, afinal, da noite para o dia, elas deixaram de existir!), proibir atinge finalidades que incontáveis campanhas publicitárias buscam há anos, sem o mesmo sucesso (além de ser mais barato...).

Entretanto, precisamos proibir direito. Encontrar alternativas sistêmicas e integrais ainda é um desafio, afinal, sacola de supermercado não pode, mas sacola de sacolão pode e sacola comprada pode?!
Melhor teria sido proibir as sacolas de plástico, todas. E criar uma maneira racional para enviarmos o lixo de nossas casas para o lixo de nossas cidades e daí para a reciclagem, da maneira menos dispendiosa para o ambiente possível. Investir em energia limpa.

São soluções possíveis ao Público, não aos indivíduos. Por mais complexa que tenha se tornado nossa sociedade, dentro dela o Estado ainda tem maiores responsabilidades, mas também maiores possibilidades de êxito.

O impacto sobre o planeta pode ser maior e ele ficaria mais feliz com menos lixo.
E nós, pessoas, ficaríamos mais felizes com menos informações, falsas necessidades e demagogias.

Ecológicos eram nossos avós. Sem desperdícios ou alardes.
[Juliana]

*foto tirada do maravilhoso trabalho de Vik Muniz