terça-feira, 23 de novembro de 2010

MARCA-PASSO

                                              (pro meu pai)


Seu coração é do tempo de longínquas guerras.
Os homens eram inocentes
e ainda usavam chapéus.


Nas ruas corriam bondes,
não havia avenidas
e o mar era só paisagem.


Suas histórias e crenças
(de tudo o que já não há)
(naquilo que já se foi)
engendraram substância indelével
nas linhas de minha vida.


Na minha mão está o seu registro.
Estamos presos ao tempo
e somos únicos um para o outro.
A lenta batida de seu peito
marca passo acelerado em meu coração.
(Marina Procópio)

terça-feira, 9 de novembro de 2010

2010


Eleições responsáveis pelo desencadear de questionamentos individuais que, até então, permaneceram inéditos em meu coração.
Sempre fui contra qualquer forma de discriminação, mas, até ser mãe, nunca havia sentido na pele quaisquer dos tipos de suas mutações.
E talvez influenciada pela sutil e profunda mudança do inconsciente coletivo da sociedade em que me encontro inserida, estivesse excessivamente orgulhosa e esperançosa com os rumos tomados pelo mundo e, sobretudo, pelo meu país. País este que, pela primeira vez em sua história, portou-se como um dos protagonistas deste processo global, assumindo importância jamais imaginada por nós, reles brasileiros.

Afinal, estamos historicamente acostumados à lógica da subserviência. Lógica esta que nos presenteou com olhos que enxergam de baixo para cima e de cima para baixo.

Triste e doentio olhar do qual nasceram (também) preconceitos – transformados, por aqueles que os compartilham, em verdades inquestionáveis.

Da conclusão surge possível resposta para minha espantada pergunta: por que, ao votar, as pessoas defendem idéias destituídas de lastro? Por que acreditam mais no que se fala e menos no que se faz? Por que resultados concretos nada dizem a elas?

E ao vivenciar um processo eleitoral esvaziado, pautado em discussões estéreis e exclusivamente centralizado na figura individual de seus candidatos, fui obrigada a refletir. Afinal, muito pouco daquilo que considero importante em um processo eleitoral estava sendo realizado. De quanta fragilidade padece nossa democracia!

As grosseiras acusações à candidata Dilma (que, em parte, tem relação com o seu gênero), o lamentável papel de parte significativa da igreja católica deste país, que, ao contrário do que prega, fomentou ódio e discórdia, aliados ao já comezinho desserviço que a imprensa nativa nos presta, obrigou-me a rever parte dos conceitos pessoais que tinha sobre nós, brasileiros. Nós que somos um povo e uma nação, mas, sobretudo – e a despeito da infelicidade desta conclusão para alguns – uma raça.

Senti-me envergonhada por ser parte do coletivo que se recusa a discutir tão fundamental questão como o aborto, que se sente tão incomodado com o fato de que parcela significativa dos seus integrantes ascendeu socialmente, que admira tanto a situação do povo da Noruega, mas não a deseja para o Brasil, que tem sede de justiça desde que não seja a social.

Afinal, o sonho da minha empregada doméstica não tem a mesma legitimidade do meu. Para que ela quer ter duas televisões em casa e de onde recebeu a permissão para sonhar que seu filho entre na universidade? Onde aprendeu a exigir direitos?

Quebrada (em tão pequena parte...) a barreira social que nos separava, fomos obrigados a expor o que nossa privilegiada situação de desigualdade blindava: não gostamos de raças misturadas, não gostamos de mulheres (sobretudo se estiverem no poder), não gostamos de empregados que nos olham de frente, não gostamos de outra religião que não seja a nossa, não gostamos de ser povo.

Enfim, não gostamos de nós.

Histórica ferida a ser ainda curada.

Precisamos, urgentemente, nos revisitar e rever: como indivíduos e como sociedade.
Contudo, o resultado das eleições, a despeito do seu processo e de seus paradoxos, mostrou que a vontade de grande parte da nossa brasileira raça é de superar verdades que, olhando com olhos que enxergam horizonte e horizontal, não são tão verdades assim. [Juliana]

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

SIM, PRECISAMOS SEGUIR MUDANDO!

Sorrindo. Foi como acordei hoje. Elegemos nossa primeira presidente mulher mas, muito mais que isso optamos pela continuidade de um governo que conseguiu resultados nunca antes alcançados.

Decidi, antes das eleições, não discutir as razões do meu voto, pois percebi que nem os argumentos mais claros, os dados mais concretos ou as conquistas mais importantes seriam levados em consideração por quem optou em dar seu voto ao candidato adversário.

“Precisamos mudar”; “É saudável a alternância de poder”; “Não é bom para o país que um partido fique por tanto tempo no poder”. Ouvi muito estes argumentos e concordo com eles. O que não entendo é porque tão grande incômodo e tamanha vontade de mudar um governo cujos indicadores econômicos e, principalmente, sociais demonstram incontestáveis avanços.

Não percebi tal empenho na tão defendida “alternância de poder” antes da eleição do nosso presidente “operário”. Interessante esse apoio às promessas do candidato “do bem” em lugar das realizações do governo do “sapo barbudo”. Descobri que políticos e partidos que já tiveram oportunidade de governar, por um período infinitamente maior, e que não conseguiram, por falta de competência, interesse ou vontade, obter resultados como os alcançados nestes últimos anos devem merecer uma nova oportunidade! Quem sabe mudaram o foco?  Quem sabe aprenderam como governar visando o bem do povo?

Há quem acredite em gnomos e coelhinho da páscoa! Não faço parte desse seleto grupo de pessoas. Outra chance? Não com meu voto!

Também não me iludo. Temos um longo caminho a percorrer, muitos problemas a resolver e muito trabalho até que nosso país alcance os índices sociais desejáveis, mas ter 31 milhões de pessoas passando para a classe média e 28 milhões saindo da pobreza absoluta é um começo e tanto!

Eu acredito em realizações e não posso esquecer como éramos subservientes, desiguais, frágeis economicamente. Compartilho com os presidentes Lula e Dilma o sonho de viver em um país mais justo. E hoje, ainda sorrindo, estou certa que vamos indo na direção certa! [J.]