segunda-feira, 21 de novembro de 2011

MAL ESTAR


Minha pele de cordeiro esconde um lobo
Que é o senhor de seu território,
Dominado com fezes, urina, garras
E tranqüilidade.

Por isso corro e bebo e fumo
E choro à noite e me perco,
Sem rumo.
Ignoro o território da civilidade.

[Marina Procópio]

sábado, 12 de novembro de 2011

DOENTES




A morte do cinegrafista que acompanhava a entrada do BOPE em uma favela carioca não deve ter passado ilesa a várias consciências brasileiras. Tristeza. E convite à reflexão.

Vivemos em um país onde o homicídio indiscriminado é cotidianamente praticado pelo Estado. Lembro-me de uma cena, vista há algum tempo atrás pela TV, em que traficantes fugiam a pé e a polícia, de helicóptero, atirava em todos.

Chocou-me: a cena. A forma com que se narrava o fato era de empolgação (não é à toa que não assisto mais à televisão): imprensa que não pensa e não ajuda a pensar sequer cumpre sua função técnica. Que dirá sua responsabilidade ética e social. Afinal, todos – indivíduo ou organização – somos responsáveis pela realidade que nos permeia: necessidade mera de sobrevivência da espécie.

Chocou-me: a reação de vários de nós, brasileiros. Infinitamente mais que a cena por si. Pessoas sentiram-se felizes e protegidas pela ação da heróica polícia. Não se importaram com a forma e o conteúdo da narrativa a que assistiram. Sequer pensaram que aquilo era um crime, acontecendo ao vivo, a alguns quilômetros de suas casas, respaldado pela imprensa, pela polícia e pelo Estado.

Remanescente indiferença... Acordada (por quanto tempo?) pela morte de um repórter, que não é bandido de morro. A permissividade e a natureza desses juízos são de assustar.

Pensemos: um Estado de Direito que consagra, para assim poder se definir, o justo julgamento – que implica indispensável defesa do acusado e não admite a pena de morte civil – não pode apresentar como solução para os crimes cometidos em seu território o massacre humano público e indiscriminado, por pior que seja o suposto bandido: até ser investigado, acusado e condenado, ele não passa de um suspeito. E mesmo condenado, não pode ser morto por seus crimes.

Não confio em indivíduos que falam, mas não fazem: o que nos define são nossas ações, não nosso discurso esvaziado e inconsistente, justamente pela falta ou execução de ações a ele contrárias.

Transportemos a constatação para esferas coletivas: enquanto sociedade organizada que somos estamos ignorando a forma legal que escolhemos para viver e consagrando, através de nossas ações ou omissões, outra bastante diferente.
De duas possibilidades uma: ou discutimos a permissão de extermínio pelo Estado e a tornamos legal ou acontecimentos como os mencionados aqui precisam ser combatidos pelo Estado e (sobretudo) por toda a Sociedade que o sustenta.

A morte do repórter foi triste. E um acidente que provavelmente incitará discursos (e ações, quem sabe) no sentido de mais armar o Estado (e os criminosos, por óbvia conseqüência), permitindo, assim, a morte de mais cidadãos brasileiros. Quer gostemos ou não, nossos bandidos são frutos da sociedade que construímos tanto quanto suas vítimas. Por ambos – partes do mesmo todo – precisamos nos responsabilizar.

E não será estranho possuirmos uma polícia militar, com formação de exército, em nossas ruas? Façamos uma comparação – apenas para facilitar a visualização de funções – entre exército e polícia federal, pensando em suas formações técnicas: o exército é treinado para matar o inimigo. A polícia, para investigar e servir a seus cidadãos, protegendo-os e entregando supostos criminosos ao sistema judiciário.

Agora, subamos o nível econômico: imaginemos a polícia militar invadindo, trocando tiros e matando traficantes e moradores de um condomínio de alto luxo. Mais: a polícia militar invadindo o Congresso Nacional atirando em criminosos de branco colarinho.
A imaginação torna mais visível nossa vulnerabilidade: existe processo legal neste país?

Se história não servir para aprender, melhor soterrar de vez o passado e voltar a fazer fogo com palitinho e pedra.

Acho que estamos doentes da cabeça. E cegos, de olho e de alma. [Juliana]

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

SÓ PARA CHORAR

Indicado por mim na seção Navegue, o blog Só para Chorar, foi criado para que um amigo, uma mente fervilhante de idéias, postasse  ali, as pérolas que ele, inesperadamente, cria!
José Alberto ou Zequinha ou Zeca ou apenas Zé: Deleuziano, viajante, ansioso, aberto, super ativo e criativo, iniciou sua participação em nossos encontros como o marido da amiga blogueira que aparecia de vez em quando em nossas reuniões, dando opiniões, polemizando (sempre) e tornando memoráveis nossas noites regadas a vinho e cerveja gelada. Hoje é parte do grupo. Sua ausência é sempre notada. Sua presença garantia de ótimas risadas!
Como era de se esperar, esse fervedouro todo jamais se acalmaria, sentaria em frente a um computador e alimentaria constantemente seu blog. Isso acontece, mas muito de vez em quando, e sempre após reclamarmos e pedirmos para que ele nos brinde com seus haikais mordazes, humorados, espirituosos e cortantes.
Na condição de fã, hoje apresento a vocês alguns dos textos que eu mais gosto. Aproveito a oportunidade e deixo aqui um pedido: Zeca, my sweet loser, você poderia chorar um pouquinho mais?

THE TUDORS
Nasci para ser Tudor
mas acabei sendo Nader
 
FRANGA CONTEMPORÂNEA
Pobre Nietzsche,
Tanta luta contra o amolecimento moderno!
Nada de super-homens.
Só frangas.
E de granja.
 
MPO
Havia uma terra onde todo mundo escrevia muito bem.
Itabira.
Sou belorizontino.
Escrevo mal.
 
HORA DE MORRER
O que fazer?
Existe algum livro de auto-ajuda?
Acho que rezaria.
Alguns corajosos ateus, não.

Deus, Você está na rede?
 
BOX 9
UTI.
Alguém morre.
Falência múltipla de órgãos.
Estado terminal.
Na hora da morte, não há poesia.
 
SÓCRATES CONTEMPORÂNEO
Hoje, encontrei nosso Sócrates.
Mendigo, doido e só.
Nem por isso menos sábio.
Hoje, uma nova caverna se forma.
Escutemos Álvares de Azevedo: a ciência é falsa e esquiva,
ela mente e embriaga como o beijo de uma mulher.
Vadia.